sexta-feira, 28 de junho de 2013

quarta-feira, 19 de junho de 2013

sexta-feira, 14 de junho de 2013

RED LINE 7000 (1965)


por Joaquim Pinto

É aliciante escrever sobre Red Line 7000, pois trata-se de um dos filmes menos conhecidos do período dos anos 60 na obra de Hawks. Passou despercebido nos circuitos comerciais, tendo em alguns países sido amputado pelos distribuidores de algumas sequências fundamentais. Provavelmente a própria atitude de Hawks, que disse não gostar particularmente do filme desencadeou uma reacção fria na maioria dos críticos. Trata-se no entanto de um filme extremamente económico e conciso, lembrando algumas obras dos anos 30, em contraste com o resto da produção dos anos 60. Partindo de uma ideia original do próprio Hawks, abre novos caminhos no tratamento das personagens que infelizmente não encontram desenvolvimento nos seus dois filmes posteriores. 

À semelhança das obras de aventuras, o paralelo entre o domínio de uma situação arriscada (neste caso corridas de automóveis) e o sucesso nas relações afectivas é evidente, e nos dois casos só pode ser conhecido através do recurso à intuição e ao pensamento instintivo. Todos os bloqueamentos que levem a uma apreensão esquemática da realidade são potencialmente perigosos, quer em termos pessoais, quer em termos profissionais.

O acaso tem também um papel decisivo, e pode alterar significativamente o curso dos acontecimentos.

O filme alterna quatro sequências de corridas de automóveis, em cada caso com saídas imprevisíveis, com o desenvolvimento de três relações que se bloqueiam por atitudes rígidas; o par DAN/HOLLY, em que ela teme a possibilidade de causar a morte ao homem com quem se envolver (há dois casos anteriores na sua vida); o par NAD/JULIE, em que ele é incapaz de reagir sem ser em termos da ambição e do sucesso imediato; o par GABY/MIKE, em que ele vive obcecado com a necessidade de se rodear de objectos novos (note-se o pormenor do ranger dos sapatos de Mike na banda sonora sempre que este se desloca, como se o uso de objectos "não tocados" fosse uma necessidade inconfortável).

Verdadeiramente original face à anterior temática de Hawks é que nenhuma destas relações encontra saídas definitivas no final. Quando Holly julga haver dominado o seu medo, a morte de um corredor desconhecido no último plano do filme vem recolocar a questão para qualquer das próximas provas do campeonato. Ned só volta para Julie depois de diminuído fisicamente, e a sequência final em que este conduz com dificuldade manuseando o volante com um gancho no que lhe resta do braço esquerdo pode ser indicação do futuro que poderá ter essa ligação. O caso de Mike é mais complicado. O que o obceca na sua relação com Gaby não é o facto de esta não ser virgem, mas ser assaltado por imagens sexualizadas de Dan, com quem ela manteve uma ligação anterior. Isso é evidente na sequência em que, depois de ter tentado assassinar Dan, lhe vem pedir desculpa. Gaby está presente acidentalmente, mas é claro que quem ele procura é Dan, e depois de fazer um longo discurso sobre Gaby, sugere a Dan que o agrida. Quando este o derruba com um soco, a resposta de Mike é "só vim cá para isso".

A resistência feminina a esse universo neurótico é organizada, e não há entre as personagens femininas qualquer traço de rivalidade. Pelo contrário, a cumplicidade entre Holly e Gaby, que partilharam o mesmo homem em momentos diferentes, falando francês sempre que se encontram, contrasta com a incapacidade de Mike em se relacionar com Dan, ou mesmo com Pat, o seu patrão, a quem não se conhecem quaisquer ligações.

Lindy, dona do bar onde vão invariavelmente parar as outras jovens nos momentos de impasse, funciona como pólo de atracção oposto ao ambiente competitivo masculino. Ela própria, vítima de duas ligações com corredores que terminaram mal (no filme diz-se que é agora casada com um empregado bancário que nunca se vê, afastando suspeitas sobre interpretações dúbias do seu envolvimento próximo nos problemas das outras mulheres) organiza a sobrevivência das outras personagens femininas, oferecendo-lhes trabalho e dando-lhes conselhos.

Todo o ambiente de Red Line 7000 é artificial. O motel da Holliday Inn, submergido em música pop, os transistores e outros objectos de consumo imediato, as garrafas de Diet-Pepsi, e sobretudo a ideia cara aos anos 60 de que as ligações podem ser indefinidamente intermutáveis como objectos de troca, sem qualquer dano para os intervenientes. A imaturidade das personagens desenvolve-se nesse terreno.

Sequências fundamentais: Nad e Julie na cama, na primeira noite em que saem juntos. Um longo e enigmático plano em que Julie insistentemente pergunta como são as outras mulheres na cama; os momentos partilhados entre Gaby e Mike, onde qualquer diálogo é impossível, e o encontro se dá através da vivência de objectos comuns aos dois (assobiando uma música, conduzindo a alta velocidade); a canção pop cantada por Holly, sobre um personagem de banda desenhada, genialmente precursora do rap actual; a agressão de Gaby por Mike, em que este esmaga cautelosamente o cigarro aceso com o sapato novo; todas as sequências de corridas.

Red Line 7000 dá a sensação de ter sido dirigido intuitivamente, com um naipe de actores totalmente desconhecidos (com excepção de James Caan ainda imberbe) que respondem com brio à complexidade das situações. Neste filme, todos os homens se olham ao espelho (Mike penteia-se antes de ir ao enterro do seu colega, terminando com uma expressão de desgosto) e todas as mulheres usam pestanas postiças. Curiosamente Gaby só deixa cair as pestanas quando conversa com Dan, depois da ligação ter terminado.

in HOWARD HAWKS - Cinemateca Portuguesa












































mise en scène...