domingo, 31 de maio de 2009

"Ace in The Hole" - 1951

Há três filmes que me fazem perder toda a esperança, toda a crença e fé na Humanidade. São filmes violentíssimos que "despem" o ser humano de toda o seu altruísmo. Filmes que, em suma, não acreditam na bondade do ser humano. São eles: "Fury" de Fritz Lang, "Salò" de Pier Paolo Pasolini e de Billy Wilder:


De Billy Wilder sempre foi este o meu preferido (seguido de "Love in the Afternoon" com Audrey Hepburn, "Sunset Boulevard" e "One, Two, Three" - e todos estes me parecem retratar a Humanidade de forma cruel e implacável), por ser violento a um nível que nenhum filme é hoje em dia. Não se vêem rios de sangue, não há armas e tiroteios e não há perseguições. Há um jornalista que explora um ser humano para conseguir uma história e que não é impedido, apesar de haver imensas ocasiões para isso e de haver imensas pessoas que o possam fazer. O "Ás no Buraco" é um homem que fica preso num desabamento duma mina, e que é "resgatado".
Pus resgatado entre aspas, porque o modo de resgate não é propriamente o mais eficaz, e não serve propriamente os interesses do resgatado, mas antes do jornalista que quer vender mais jornais, do xerife que quer ser reeleito, da mulher do "Ás no Buraco" que tem um restaurante e que ganha rios de dinheiro. O filme tem um título alternativo: "The Big Carnival", que nos remete para o parque de diversões que lá é montado e para a multidão que "acode" o homem, e pus acode entre aspas porque a multidão não podia preocupar-se menos com o homem. É um circo, um concurso, quem tiver mais pena do homem ganha. A pena é sempre muito bonita e ter pena é uma desculpa para não fazer nada. E o dinheiro todo vai para o Homem quando ele de lá sair por isso participar no "Carnaval" é uma boa acção.
É o jornalista (fabuloso, fabuloso Kirk Douglas - não há adjectivos suficientes para esta interpretação) que desencadeia o "O Grande Carnaval", mas não é ele a pior pessoa que lá está, e isso vamos percebendo aos poucos.
"O Grande Carnaval" ou "O Ás no Buraco" é um hino de denúncia a uma sociedade sem escrúpulos, podre por dentro que se formos a ver bem, não é muito diferente da nossa.


quinta-feira, 28 de maio de 2009

"Red River"-1948

O que mais gosto em "Rio Vermelho" de Howard Hawks não é a interpretação de John Wayne (que aliás é soberba - assim como é tudo o que vou enumerar a seguir), nem a de Montgomery Clift ou do resto do elenco. Não é o argumento de Borden Chase (Borden Chase escreveu o argumento para um filme de Anthony Mann que eu acho magnífico e cuja história se assemelha a este "Red River" - "Bend of the River") e Charles Schnee, nem a realização apurada de Hawks. Não é a música de Dmiotri Tiomkin e não é a fotografia de Russel Harlan.
Não, o que eu mais gosto no filme (e será porventura por o ter visto tantas vezes) é o percurso que um determinado objecto faz no filme ( esse percurso sustenta aliás toda a acção do filme ). A pulseira da mãe do personagem de John Wayne, Dunson (não vemos a pobre senhora, Dunson apenas refere esse facto). Passa a pulseira de mão em mão, então. De Dunson para a sua amada, da sua amada para os índios e para Dunson outra vez. Passam uns anos, vemos a pulseira com Matt (Montgomery Clift, filho adoptivo de Dunson), e a história repete-se...

Dizer que o melhor de um filme é uma pulseira, não é ter esse filme em grande conta, pensarão vocês. No entanto, quando me lembro de "Red River" é nisso que penso. A pulseira é aliás importantíssima para todas as personagens (Dunson principalmente), e a partir dela podem-se definir várias relações entre personagens: Dunson-Matt e destes dois com as mulheres das suas vidas, Tess e Fen (Joanne Dru e Coleen Gray, respectivamente). Dunson dá a pulseira a Fen, mas esta é-lhe devolvida (Dunson encontra a pulseira na mão de um índio deduzindo então que Fen está morta), Matt dá a pulseira a Tess e a pulseira fica com ela (Matt consegue então fazer aquilo que Dunson não conseguiu: assentar).
Mas não só disto vive "Red River". Há ainda a travessia da manada de Dunson pelo oeste, e da sua tirania para com os homens que o ajudam. A personagem de Dunson é tão fascinante como violenta, viu o seu negócio arruinado no Texas (a cotação do gado é baixíssima) e começou uma demanda pelo "Rio Vermelho" do título, e é na imensidão deste rio, na sua costa, que se passa a maior parte do filme.

No final, "Red River" é um épico da envergadura do próprio empreendimento que relata, um western arquétipo de tantos outros depois dele e que instituiu John Wayne como figura eterna do oeste. É Shakespeare no Oeste.

sábado, 23 de maio de 2009

Sabem, aquele pequeno "editor"

Nunca hei de perceber como é que robert wise passou para a prosperidade. Fez filmes como "west side story" e "the sound of music". Filmes que passam constantemente na televisão e cujas músicas são entoadas, assobiadas e cantadas constantemente. São filmes que ganharam nos anos em que concorreram aos Óscares (61 e 65), vencendo a outros bem mais interessantes como "The Hustler" de Robert Rossen (alguém se lembra dessa pequena maravilha?) e "Doctor Zhivago" de David Lean.
Porque é que nunca ninguém pensa em robert wise como estando associado à desgraça desse sim, um grande realizador - Orson Welles? O segundo filme que este fez, "The Magnificient Ambersons", foi re-editado pelo estúdio ( com a ajuda desse pequeno "editor" - robert wise ). Depois disso, Welles foi para a Europa e fez mais 10 filmes ( 3 ainda nos estúdios de Hollywood - "The Stranger", "The Lady From Shangai" e "Touch of Evil", mas sempre com grandes problemas) e Robert Wise iniciou uma prolífera carreira que passou os 40 filmes ( contando com esses dois musicais que acabaram com o Musical ).
Nos anos desses musicais, Welles realizou na Europa "The Trial" (filme maravilhoso, que capta toda a estranheza e mistério das obras de Kafka, que é o autor do livro que inspirou o filme), e "Chimes at Midnight", que não vi e que não está disponível em DVD . Eu trocava 1000 "west side story" e 1000 "sound of music" por um frame de "THE TRIAL".


R.I.P. ( 1935-2009 )


Morreu dia 21 de Maio o maior cinéfilo português. Ele que tanto viu, tanto escreveu, provavelmente até mais que todos, foi também actor em alguns filmes de Manoel de Oliveira ( podemos vê-lo no papel de Papa João XXIII durante o segmento de Oliveira em "Chacun son Cinéma"), usando o nome Duarte de Almeida.
Morreu o homem, mas não o legado. Não enquanto houver pessoas que leiam os seus textos e partilhem o seu amor pelo Cinema.


domingo, 17 de maio de 2009

"City Lights" - 1931

Aviso desde já que este texto não é sobre, mas sim a propósito de "City Lights".

No princípio de "Luzes da Cidade" de Charles Chaplin, vê-se este conjunto de palavras (depois do "revelar" do título do filme) : "A Comedy Romance in Pantomime Written and Directed by Charles Chaplin". A propósito da pantomima, Chaplin disse isto aquando do aparecimento do "sonoro": "O filme falado ataca as tradições da pantomima que tentámos estabelecer com tanta dificuldade no ecrã e na qual a arte cinematográfica deve ser considerada. Destrói toda a técnica que adquiruimos". Tendo em conta estas citações e o desenvolver da pantomima nos anos 10 e 20, não consigo deixar de pensar que o que o sonoro trouxe foi uma banalização do campo - contra-campo e uma simplificação da linguagem audio-visual. Estou a exagerar, claro, mas tomemos as telenovelas como exemplo. Será que o público "destas coisas" (depois de anos e anos de convivência com os efeitos subversivos da novela) consegue apreciar, ou até mesmo entender a simplicidade aparente do primeiro encontro de "Charlot" com a rapariga das flores. É algo para pensar, certamente. Voltando ao "sonoro", é um facto que ele trouxe possibilidades maravilhosas, e também Chaplin se apercebeu disso, mas não aderiu logo de seguida. E é verdadeiramente interessante observar a transição de Chaplin. O primeiro filme sonoro de Chaplin é "The Great Dictator", mas "City Lights" tem já muito de "sonoro". E "The Great Dictator" tem por sua vez muito de "silencioso". Penso no caso do "Dictator" na cena do globo terrestre, e no caso de "City Lights" na luta de boxe, por exemplo (há mais, muitos mais). "One A.M" (filme cómico que consiste numa luta "corpo a corpo" entre Charlot e um cenário) é de 1916 e em termos de transmissão de mensagens, linguagem.. é muito parecido com "City Lights" e como já aproximei também este último de "The Great Dictator", resta-me então transmitir a minha crença de que a linguagem cinematográfica de Chaplin é tão vincada que não pode ser pensada em termos de "silent" e "talking". Chaplin não fez "mudos" e "falados", fez FILMES toda a vida.

Mais duas coisas: todos os filmes de Chaplin que citei aparecem nesta lista de Jonathan Rosenbaum. A lista é obviamente subjectiva, e cada um pode concordar ou não com ela ( eu acho contestável, por exemplo a ausência de John Carpenter da lista), mas acho que é de visitar.
Porque gosto de estabelecer relações, e neste caso é uma "filiação", sempre achei Jerry Lewis um genuíno e sincero seguidor da arte de Chaplin. Senão veja-se o amor de ambos pela pantomima, e também a criação de dois personagens muito merecedores de empatia por parte do espectador. Mas enquanto que Chaplin é considerado um génio, Lewis anda um bocado esquecido.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

"Jackie Brown"-1997


Da obra de Tarantino consegui separar as que acho boas ("Pulp Fiction", "Jackie Brown", "Kill Bill"), das que acho menos boas ("reservoir dogs", "death proof"). Das boas sempre preferi "Jackie Brown". Em "Jackie Brown" as "homages" não se sobrepõem à história (como em "reservoir dogs") nem a forma, o estilo "atropela" o conteúdo (como em "death proof").


"Jackie Brown" adapta "Rum Punch" de Elmore Leonard, é o único argumento adaptado de Quentin Tarantino e no entanto é neste filme que eu sinto mais originalidade. Em "Kill Bill" pensamos repetidamente: "De que filme será isto?" e será esse o seu principal objectivo e a sua principal força: a crença de estarmos numa viagem alucinante pelo cinema asiático mais ou menos obscuro ou até pelo western clássico e spaghetti. A "Pulp Fiction" associa-se todo um conjunto de filmes "noir" dos anos 40 e 50, "Kiss Me Deadly" de Robert Aldrich, "Panic on the Streets" e "On the Waterfront" de Elia Kazan, entre outros.
Eu considero tanto "Pulp Fiction" como "Kill Bill" excelentes filmes e sou o primeiro a fazer a vénia a Tarantino pela sua capacidade de referenciar filmes e de ver os filmes ou antes a cinefilia como uma força capaz de influenciar a vida e de ser a própria vida, seguindo o exemplo de Godard.
Ainda assim, "Jackie Brown" é o meu preferido ( se "Inglorious Basterds" não o suplantar). Por ser um filme carregado de maturidade, adulto e por ser a melhor história de amor dos anos 90 ex-aequo com "The Bridges of Madison County" de Clint Eastwood.



domingo, 3 de maio de 2009

Dois Anos

Vejo o meu segundo post no blog, em 2007. "All That Jazz" como único representante dum género tão rico como o musical. Quase dois anos depois, consigo lembrar-me muito rapidamente de três musicais que prefiro a este, sem por isso deixar de apreciar o "testamento" de Bob Fosse. Ei-los:


"Gold Diggers of 1933" de Marvin Leroy:


"On the Town" de Stanley Donen e Gene Kelly


"Bells are Ringing" de Vincente Minnelli