terça-feira, 5 de outubro de 2010

Cimino



A carreira de Michael Cimino faz lembrar um pouco a de Orson Welles. Aclamados e "amados" no início de carreira, tornaram-se subitamente, e, diz-se, pelos seus (maus) génios, pelas suas exigências, outsiders. É curioso, porque o filme que afundou a nova Hollywood, foi feito quase back to back com The Deer Hunter, o filme da glória de Cimino. O próprio Cimino repara que "poucas horas antes de ter ganho o Óscar por O Caçador, tinha estado a fazer provas de guarda-roupa a Kris Kristofferson para As Portas do Céu. Foram cinco anos de trabalho, entre a escrita e a rodagem de ambos. Quase não houve intervalo. Portanto, para mim, não há separação nenhuma entre os dois".

Não tendo visto ainda Heavens Gate, acredito que partilhe da mesma ideologia de The Deer Hunter, um retrato fiel da América e do seu povo, durante dois acontecimentos marcantes (e sangrentos) da sua História. Foi a vergonha americana pela sua História, mais que quaisquer exigências griffithianas de Cimino, que causou a queda do realizador.

Year of the Dragon chegou cinco anos depois (Cimino só fez sete filmes) e só piorou as coisas (muito injustamente, diga-se). Retratava as tríades chinesas na América, que na altura se consideravam fictícias, e apesar das suas imensas qualidades (a poesia ciminiana, os movimentos circulares, o scope esférico e mágico, e calo-me por aqui) não foi um sucesso. Mas a tour de force de Michael Rourke e o retrato de uma América dilacerada e nos escombros fazem do filme, hoje, um dos símbolos maiores dos anos 80.

Depois de The Sicilian e de Desperate Hours, remake do filme de William Wyler e com Humphrey Bogart, dos anos 50, veio The Sunchaser, que continua a ser o único filme de Cimino, nos últimos 14 anos, isto se excluírmos o segmento No Translation needed, de Chacun Son Cinéma. Tem a mais bela interpretação, que me lembre, da carreira de Woody Harrelson e é de um amor acutilante aos seus personagens. Almeja um regresso a certas origens (históricas como cinematográficas) e é paisagem e arrebatamento, vida, morte e o limbo entre os dois. Não é perfeito, mas é um dos mais sinceros e belos filmes dos anos 90.

Crítica de Roger Ebert a The Deer Hunter
Crítica do mesmo Ebert a Heavens Gate
Entrevista ao realizador, aquando de uma retrospectiva na Cinemateca Portuguesa (onde diz, por exemplo, que Visconti, Ford e Kurosawa formam a sua Santíssima Trindade. "Visconti é o Pai, Ford é o Filho e Kurosawa o Espírito Santo" - e, curiosamente, percebe-se isto perfeitamente ao ver os seus filmes.

2 comentários:

Álvaro Martins disse...

O Heavens Gate é um grande filme. Para mim é tão bom ou melhor que o The Deer Hunter. Ainda me falta ver muita coisa de Cimino, mas concordo contigo, é um dos mais esquecidos.

João Palhares disse...

A ver se vejo o quanto antes o Heavens Gate.
Esquecido mas por nós não, por nós não...