sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Blake
















Tenho que o escrever.. porque esta doeu um bocado..



The Party é dos filmes que mais adoro. É, a seguir ao Rio Bravo e ao Playtime, mas por razões diferentes, o filme que mais prazer me dá rever. Por Sellers, por concentrar a comédia num episódio, no quotidiano, por dividir e multiplicar a simplicidade, o objecto, por se recusar a dizer que é simples pertencer a um "espaço", seja ele qual for, ou que é simples festejar. Por me inspirar, mesmo, a muitos níveis. Por Edwards.

Adoro The Party, também, porque o plano geral, tão próprio à comédia, aqui associado à compressão do espaço e do tempo, ao retrato distanciado e constante de situações (e a coisa não me parece inocente), produz algo de extraordinário: a sensação de presença. Poucas vezes em comédia, como em The Party, se pôde "estar tão lá" como se está, se pôde observar tanto como se observa, sem ser observado. Sem ser apanhando. O Cinema inventou a invisibilidade, tornou possível ver sem ser visto.

Brincar com Hollywood. A primeira cena de The Party descodifica géneros. Começa como um filme histórico de guerra, do qual começamos a duvidar quando a câmara mostra tempo demais o homem da corneta, mais ainda, quando é atingido e volta a tocar, totalmente, quando passa a fazê-lo incessantemente. De um filme de guerra, para um filme de guerra pouco verosímil, para uma comédia. Assim, ficamos sentidos com a morte do homem, depois rimo-nos dos erros e daquela insistência irrealista em não morrer até, por fim, percebemos tudo, pela presença da câmara, de um realizador e de um produtor.

A festa, essa, é na casa de um produtor de Hollywood, e a hipocrisia da Indústria é posta ao descoberto, ali. Edwards teve problemas com essas hipocrisias, deve ter assistido a muitas festas dessas em que os convidados eram escolhidos a dedo, para fechar negócios, e convocou um convidado surpresa para expôr tudo ao absoluto ridículo, com elefantes, papagaios, máquinas e espuma.


A comédia de Lewis, como a de Edwards em Shot in the Dark e The Party, assenta na exteriorização extrema dos sentimentos, da personalidade, do indivíduo, enquanto "os outros" usam as máscaras que lhes convêm, impessoalmente, rotineiramente. Rimo-nos e empatizamos com os heróis destes filmes, porque eles, no fácil processo de serem eles próprios, desmascaram a impessoalidade que é própria a certos eventos. A certas situações. À artificialidade e ao decoro. E ao vermos isto, abala-se nos a consciência um bocado, porque percebemos que queremos ser os Lewis e os Sellers desses filmes, mas somos "os outros". É possível existir sem chegar a ser. Porque é difícil "ser eu" no Mundo, é difícil vencer um mundo que se alimenta de primeiras impressões e aparências. É muito difícil. Somos todos excepções mas alimentamos a regra, o uniforme e o standard.

Obrigado, Blake.. Se sou mais "eu", hoje, é porque me ajudaste. Somos todos excepções, contradições, mundos. Viver é fodido, como me fizeste entender. Estás bem melhor, já nada tens a perder. Nós temos. Tudo...



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