sábado, 24 de dezembro de 2016

segunda-feira, 12 de dezembro de 2016

DAR A VER



“Se a horta do seu quintal não puder ser a sua escola de cinema, o problema está com a sua idéia de cinema e não com o seu quintal”. 

“Os espíritos livres passam pela academia, os servos permanecem nela”.

aforismos de Bruno Andrade

Os “Encontros Cinematográficos” apresentam, dia 14 de Janeiro na Moagem do Fundão, o ciclo “Dar a Ver”, uma mostra de filmes portugueses recentes, alguns primeiras obras, que não tiveram estreia comercial, apesar de muitos terem percorrido vários festivais nacionais e internacionais. O ciclo resulta da constatação de que grande parte do cinema português dos últimos anos tem sido feita completamente à margem, com poucos meios ou meios nenhuns. Estes filmes são algumas das pequenas pedras (pérolas) invisíveis, que também ajudam a construir o grande edifício chamado Cinema. Ao invés de varrer esses filmes para debaixo do tapete como se não existissem, procuramos dar-lhes visibilidade, entendê-los, discuti-los, criando uma memória activa e crítica, quer através da projecção e do encontro, quer através de um jornal com diversos textos inéditos de Hugo Pereira, Daisuke Akasaka, Bruno Andrade, João Palhares, Tiago Costa, Ivana Miloš e Mário Fernandes. Os realizadores convidados – Hugo Pereira, Vanessa Duarte, Hiroatsu Suzuki, Rossana Torres, Daniel Pereira, José Oliveira, João Rodrigues, Sílvia das Fadas e Nelson Fernandes -, não são funcionários da Curta-Metragem, mas cidadãos cinematográficos de corpo inteiro, como os Lumière que nos deram a ver o mundo em pequenos gestos, ou como Méliès, que “rasgou o real” para nos levar pela primeira vez à lua. Força primitiva, esclarecida e plural, de uma aula desfasada da realidade sobre direcção de actores até à animação materialista e abstracta de Paths of Light. Da fábrica de mentiras que é o ensino superior à fábrica de verdades que é a vida, a cartografia real e imaginária de um país: as memórias fabris da Covilhã, a Braga moderna de dia e histórica à noite, o Alentejo que acolheu Hiroatsu e Rossana, a ilha do Faial habitada pela família Dabney, um homem trabalhando no seu quintal na periferia de Odivelas. Saímos da sala de aula como maus alunos que somos, para abrir as lentes ao mundo, para ”dar a ver” as fábricas, os campos, as hortas, as cidades, as fotografias faladas ou animadas, os estilhaços do nosso cosmos. Filmes sem caganças, com a imparável potência das formas e a fragilidade da generosidade. Filmes, como diria Straub, que reclamam o pleno direito à cidadania cinematográfica. 

Mário Fernandes


domingo, 4 de setembro de 2016

































Emperor of the North Pole (1973) de Robert Aldrich

terça-feira, 5 de julho de 2016


When in disgrace with fortune and men's eyes 
I all alone beweep my outcast state, 
And trouble deaf heaven with my bootless cries, 
And look upon myself, and curse my fate, 
Wishing me like to one more rich in hope, 
Featured like him, like him with friends possessed, 
Desiring this man's art, and that man's scope, 
With what I most enjoy contented least; 
Yet in these thoughts my self almost despising, 
Haply I think on thee, and then my state, 
Like to the lark at break of day arising 
From sullen earth, sings hymns at heaven's gate; 
For thy sweet love remembered such wealth brings 
That then I scorn to change my state with kings.

sexta-feira, 3 de junho de 2016

quarta-feira, 27 de abril de 2016

sábado, 23 de abril de 2016

domingo, 21 de fevereiro de 2016

Double-bill (XXIV)


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THE NAKED DAWN (1955)


por João Bénard da Costa

Aparentemente, um western feito com poucos tostões, The Naked Dawn, para quem o souber ver, é uma portentosa alegoria moral. Dentro do espaço mítico do oeste (reduzido, aliás, a alguns sinais), o que nos surge é o tempo e o espaço do Kammerspielfilm alemão, que este filme tão poderosamente evoca (e mais, talvez, O Rail ou A Noite de São Silvestre de Lupu Pick que o tão citado Murnau). Tudo se passa finalmente, com poucas saídas, no espaço duma casa, entre três personagens cujo comportamento incessantemente varia e surpreende.

Dos três, o mais surpreendente é Manuel. A sua primeira imagem é do homem servil, do homem que "não é homem" para Betta St. John. Mas a partir do assalto e da assombrosa sequência da taberna (a partir da viagem) Manuel revela novas facetas: o seu amor a Santiago (chega-lhe a propor que partilhe a cama com a mulher, enquanto dormirá no chão) e a sua prodigiosa capacidade de alegria e de pura apreensão das coisas. Mas Ulmer jamais se fixa numa linearidade. Vemo-lo depois insistir em comportamentos cobardes, pensar sobretudo em apanhar o dinheiro de Santiago e tentar matá-lo por duas vezes à traição. Na última - a lapidar sequência da cobra - nova mudança do personagem. Com um "álibi" fácil, Manuel podia ter escondido a Santiago as suas intenções, mas, como o personagem que morre no princípio, insiste em confessar-se e, quase dostoievkianamente, humilha-se perante Santiago. Manuel vai-se tornando, assim, quase tão misterioso como o próprio Ulmer: percorre toda a gama de sentimentos, dos mais baixos aos mais belos, numa complexidade crescente que faz vacilar permanentemente a certeza do espectador.

O mesmo se passa com Santiago que nunca é o "bandido clássico" dos westerns, mas o homem capaz de saber (com ele e com os outros) que o mal não é o que parece ("e quando os anjos vierem, dirão a São Pedro quem tu eras e São Pedro te pegará na mão e te mostrará todas as glórias do paraíso") e capaz de perceber, no fundo, as motivações de Manuel e Maria. Por isso, se, num momento, decide levar Maria e deixar Manuel, volta sobre os seus passos e entregando-os um ao outro, oculta deles, até, a sua própria morte ("My way is not for you"). Santiago é o homem que sabe que "todas as alegrias do mundo vêm de Deus" e que percebe em Manuel a dor pelos erros próprios e dos outros ("E quando um homem tem pena do que fez, pode mudar"). Acredita nessa mudança e no fundo acredita, profundamente (e mais do que Maria) na relação entre esta e Manuel. Por ela morre, por ela é capaz de largar o dinheiro que arriscara a vida para roubar.

Finalmente, temos a estranhíssima personagem de Maria, vista pela primeira vez por Santiago, num plano belíssimo que podia ser assinado por Murnau. Se o seu desejo a leva para Santiago (a antológica sequência do banho), se é Santiago que lhe dá consciência da mediocridade da sua vida com Manuel, é através de Santiago que ela descobre Manuel e descobre a complexidade dum personagem que, como espectador, vira linearmente até aí. Por isso, é quem mais depressa se apercebe do que se passa na cena da cobra e quem, a partir dessa altura, muda de comportamento face ao marido.

Essas rupturas no interior do próprio filme e no interior dos seus três personagens centrais, que alguns confundirão com fraquezas de argumento, são o que confere a The Naked Dawn toda a sua carga de insólito. Dum tema convencional, de um ambiente convencional, Ulmer extraiu o menos convencional dos filmes, que é bem possível ver-se como uma transposição da visita do anjo a Tobias. Kennedy é o visitador, o homem que vem de longe, para ensinar a Maria e Manuel que a religiosidade se inscreve também no amor e no desejo físicos. E para transformar as várias relações duais (Maria-Manuel, Manuel-Santiago, Maria-Santiago) numa relação em que cada um é igualmente essencial a todos os outros e nada tem que ver com o habitual ménage à trois. O que não se passou na facilidade duma noite de bebedeira (e é Santiago quem o recusa) passa-se através da traição, da fidelidade e da morte, nos sonhos de há muito tempo, tornados presentes e fatais.

"There is a weakness in me", diz Manuel para explicar a sua traição. "Perhaps you're human" responde Santiago. Tudo se ilumina e, aceitando-se como são (como o tal anjo os vê), podem caminhar para "as glórias do paraíso".

Foi este aspecto - a delicadeza e a ambiguidade dos três personagens - o que à época do filme, mais surpreendeu Truffaut que comparou essa relação a três com a do romance de Henri-Pierre Rouché, Jules et Jim. "The Naked Dawn é o primeiro filme que me dá a impressão que um Jules et Jim cinematográfico é possível". A partir dessa crítica, Rouché e Truffaut conheceram-se e o Jules et Jim foi mesmo possível.

The Naked Dawn ligou, assim, historicamente, o romantismo expressivo dos anos 20 alemães à expressão romântica da nouvelle vague. Através do oeste americano, da luz de Murnau, do psicologismo intimista de Lupu Pick e Jessner. Na procura da utopia, antiga e idêntica, da junção mística dos contrários e da percepção de um Bem fundamental que se não conhece, mas que a tudo preexiste.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

2015



American Sniper, Eastwood;
Inherent Vice, Anderson;
Creed, Coogler;
Pasolini, Ferrara;
João Bénard da Costa: Outros Amarão as Coisas que Eu Amei, Mozos;
Mia Madre, Moretti;
Blackhat, Mann;
Phoenix, Petzold;
The Homesman, Jones;
Mad Max: Fury Road, Miller;

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