sexta-feira, 7 de outubro de 2011



7 comentários:

Álvaro Martins disse...

Por acaso sempre foi uma das cenas que mais me "marcou". Isro porque depois quando chegas ao fim, na cena depois do funeral, a cena final quando cantam o hino, há momentos (antes do hino) em que o silêncio da mesa, com algumas sete ou oito pessoas (+-), te faz lembrar ou "recordar" estes momentos iniciais (ou aquele em que depois do casamento o Michael corre nu pela cidade e junto à arvore fazem aquele tipo de promessa da amizade),como que numa retrospectiva. É um grande filme, considero-o, a par do Heaven's Gate, a grande obra-prima de Cimino.

João Palhares disse...

Adoro este filme.. E as coisas que o distinguem do filme de guerra "normal", vá, e do Apocalypse Now (em que é tudo um espectáculo, tudo completamente "over the top", basta ver o Duvall e o Hopper, no filme - isto pode parecer um insulto mas não é) são precisamente essas cenas antológicas, lembro-me também da cena de caça, o Michael nas montanhas. É tudo muito terra-a-terra, simplissíssimo. O De Niro está completamente distanciado da sua persona, é o Michael, idem para os outros. É tudo de uma cumplicidade aterradora. Tocante, mesmo..

Eu também gosto muito dos filmes que o Cimino fez com o Rourke e mais ainda do Sunchaser, com o Woody Harrelson..

Álvaro Martins disse...

Sim, a cena da caça também. Eu costumo dizer que este não é um filme de guerra e sim sobre o antes o durante e o depois da guerra num grupo de amigos. É mais que um filme de guerra, é um filme sobre a amizade e a vida das pessoas, a mudança que a guerra traz, mesmo a quem fica de fora, à espera do homem que está na guerra, é o antagonismo dos antagonismos - começar com um casamento e acabar com um funeral - a mesma sobrevivência que o veado mostra vão mostrá-la eles naquele cativeiro vietnamita,é a animalização da guerra que muda as pessoas, que destrói os homens. E esses momentos antológicos estão lá para nos mostrar essa descida aos infernos, essa mudança que a guerra traz, o que era e o que é, o que ficou, passado e presente.

Recentemente vi o Desperate Hours e não me pareceu ter metade da qualidade deste e do Heaven's Gate, gostei mais do Year of the Dragon, mas ainda assim (e ainda não vi o Sunchaser) parece-me que estes dois de que falo são sem contestação as suas obras máximas.

João Palhares disse...

O Cimino tem uma capacidade excepcional em transformar tudo o que filma em peosia pura, de levar tudo aos primórdios, a natureza, o sentimento e por isso é que não sei dizer com muita certeza se esses dois de que falas são melhores ou piores que os outros. Acho que o Year of the Dragon tem muito que se lhe diga, é um épico que se passa todo num bairro, mas a acção parece passar-se num cosmos imenso e provavelmente vou cometer uma heresia agora, mas acho que o Rourke é melhor actor que o De Niro; teve foi muito mais azares na vida profissional..

O Desperate Hours tem cenas prodigiosas, também. Cenas que fazem uma pessoa pensar que ele (Cimino) carrega uma herança às costas muito mais antiga que a herança que tem do cinema de Ford e até da do próprio cinema. Literatura, pintura, música, uma consciência de que as coisas existiam e aconteciam muito antes de nós existirmos, de que as coisas além de serem, já foram e também serão, um dia. No Sunchaser isto também se sente.. a sequência final do filme é espantosa, revejo-a sempre que posso, é uma lição de montagem, de contar as coisas, estória, História, etc, etc..

Enfim, é um cinema que me marca muito, demais para conseguir ver melhor o que o diferencia do que o que o aproxima. Mas sou capaz de colocar o Heaven's Gate um bocado acima dos outros, talvez. The Sunchaser, The Deer Hunter e Year of the Dragon, a seguir, e por fim o Desperate Hours e o Thunderbolt and Lightfoot..

João Palhares disse...

E acho incrível o Jonathan Rosenbaum "despachar" o Deer Hunter com palavras destas:

"A disgusting account of what the evil Vietnamese did to poor, innocent Americans stands at the center of this Oscar-laden weepie about macho buddies from a small industrial town (Robert De Niro, Christopher Walken, John Savage, and John Cazale, wasted in his last screen performance). It begins with an extended wedding sequence cribbed from Visconti and ends with a world-weary rendition of God Bless America. While the results are far from unprofessional, the cast is uniformly good, including a characteristically slapped-around Meryl Streep, and the two deer-hunting sequences mark director Michael Cimino as an able student of Disney’s Bambi and Riefenstahl’s The Blue Lightthe male self-pity is so overwhelming that you’ll probably stagger out of this mumbling something about Tolstoy (as many critics did when the film first came out in 1978) if you aren’t as nauseated as I was. I much prefer Cimino’s Heaven’s Gate. 183 min. (JR)"

É sempre tudo uma questão de política e etnias com este gajo, é mesmo incrível! Não se pode relacionar de maneira alguma com os filmes e as personagens, é-lhes sempre superior. De resto, há sempre camadas em que a maioria dos críticos se refugia: fotografia, guião, realização, interpretações, política, contextos sociais, bla bla, sem nunca tentarem desenvolver minimamente esses conceitos e perceber como é que, juntos, fazem um filme..

A Bola Indígena disse...

Adoro este filme, um dos mais intensos que já tive oportunidade de ver. Tem pelo menos 3 interpretações com nota máxima (de niro, walken e savage), e provavelmente entraria no meu all-time top 10.
Acho curioso que os críticos chegassem a mencionar a relação entre este grupo de amigos/guerrilheiros "quase homosexual"

João Palhares disse...

Ena, isso é ridículo, realmente. Nem por acaso, encontrei um texto do Jacque Lourcelles sobre o filme, agora mesmo:

"O grande filme americano dos anos 70. Com uma ambição imensa, Cimino tenta construir um cinema épico e wagneriano que é também lírico e contemplativo e não desprovido de densidade romanesca. No que concerne à força da mise en scène, Cimino é o único cineasta da sua geração no qual se pode ver, através do seu filme, um herdeiro de Walsh e, especialmente, de The naked and the dead. Isso não o impede de conduzir, através dos outros aspectos do filme, uma busca absolutamente pessoal e original. Ele atinge o poderio dramático das cenas pela duração desmesurada das mesmas, o que as torna misteriosas e encantatórias, por um senso quase mágico do cenário e pela atenção a certas características individuais dos personagens, sem qualquer preocupação de rigor dramático aparente. A busca dele vai de encontro ao centro da sua proposta; não pelo realismo, mas com o auxílio de um conjunto de alegorias que transformam o realismo em elementos de reflexão moral e filosófica. Os temas privilegiados de tal reflexão dizem respeito à energia e à vontade de poder da América. A caça, a guerra distante, o jogo cruel da roleta-russa, tudo isso são os motivos dramáticos e visuais, extremamente espetaculares, que permitem confrontar essa possibilidade de poder com o real. De acordo com os personagens, veremos esta vontade se destruir, fraturar ou mesmo perdurar, ao transformar-se e mudar de conteúdos. Epopéia de fracasso, O Franco-Atirador é também um réquiem grandioso dedicado aos sofrimentos e à estupefação da América diante da maior derrota da sua história.

N.B.: Um exemplo de pesquisa efetuada por Cimino acerca do cenário: ele explicou (em «American Cinematographie», outubro 1978) como ele tinha construído visualmente o sítio da sua pequena cidade da Pensilvânia, utilizando oito exteriores diferentes, filmados em Ohio: único meio de conseguir, segundo ele, com que uma usina se perfile no horizonte em cada um dos planos gerais de exteriores que figuram nas seqüências que deveriam transcorrer na Pensilvânia."

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