De vez em quando, convido bloggers a escolher um plano e a falar, também, sobre ele. O vigésimo sexto convidado é o Pedro Ponte, do Ante-Cinema, que escolheu o plano-sequência do corredor, em Oldboy, de Chan-Wook Park.
"A violência é provavelmente um dos temas mais dúbios em que o cinema já tocou. Seja ele desconstruído de forma racional, como Haneke ou Cronenberg tão bem fazem, ou explorado na tradição de Hollywood para nosso 'viewing-pleasure', não há como negar a sua capacidade de mexer connosco, podendo, ironicamente, chocar-nos e horrorizar-nos e ao mesmo tempo divertir-nos. Não há, hoje em dia, ninguém que melhor filme essa dualidade do que os cineastas asiáticos. E no topo da lista, como mestre absoluto da violência não como artifício mas como realidade, está o coreano Chan-wook Park, cujo "Oldboy" permanece, em minha opinião, como um dos grandes filmes das últimas décadas.
Ao tentar encontrar um plano que considerasse digno de fazer parte desta rubrica e, ao mesmo tempo, que fugisse um pouco ao tipo de cinema predominante nas escolhas dos convidados anteriores, lembrei-me quase de imediato da já mítica cena do corredor em "Oldboy", não apenas por se tratar de um dos meus filmes favoritos, mas principalmente por considerá-la uma das sequências mais brutalmente realistas, geniais e espectaculares já filmadas. A grande particularidade do cinema de Park é o facto de, ao contrário de John Woo ou Takashi Miike, nunca procurar a estilização ou o 'shock-value', preocupando-se sempre e unicamente com o realismo. Num plano-sequência quase nunca interrompido (à excepção de alguns cortes no princípio e fim), Oh Dae-su luta contra dezenas de adversários, recorrendo apenas ao martelo que usa como arma e aos próprios punhos. A violência é extrema e, ao mesmo tempo, de uma credibilidade assombrosa. Em qualquer outro filme, não hesitaríamos em descartar isto como algo irrealista em que o protagonista saía miraculosamente ileso, mas não aqui; aqui acreditamos genuinamente no que estamos a ver, sentimos cada murro de Oh Dae-su, que não se limita a desferi-los.
Este plano foi aperfeiçoado ao longo de três dias e dezassete takes, tendo sofrido pouca ou nenhuma alteração em termos de montagem, à excepção da faca que é cravada nas costas de Oh Dae-su, criada digitalmente. Park encena grande parte da acção como um videojogo ao estilo 'side scrolling' (isto apesar de já ter revelado que não era essa a sua intenção), colocando a câmara num carril e acompanhando a luta com travellings subtis, movendo-a ora para a esquerda ora para a direita, consoante o momento da luta. São quase três minutos desta dança de violência, ao som de música antagonicamente bela. Durante estes três minutos, o estreito corredor alarga-se, como os tectos por vezes desaparecem, voltando a estreitar-se quando Park corta novamente para a cara de Oh Dae-su e para a destruição por ele deixada. Quando se apercebe que tem mais oponentes pela frente, sorri perversamente, enfrenta-os e sai, cambaleando, dando seguimento ao seu amor fati vingativo. Até hoje não mais vi algo tão brutal filmado de forma tão magistral." (Pedro Ponte)
Próximo convidado a designar
Ao tentar encontrar um plano que considerasse digno de fazer parte desta rubrica e, ao mesmo tempo, que fugisse um pouco ao tipo de cinema predominante nas escolhas dos convidados anteriores, lembrei-me quase de imediato da já mítica cena do corredor em "Oldboy", não apenas por se tratar de um dos meus filmes favoritos, mas principalmente por considerá-la uma das sequências mais brutalmente realistas, geniais e espectaculares já filmadas. A grande particularidade do cinema de Park é o facto de, ao contrário de John Woo ou Takashi Miike, nunca procurar a estilização ou o 'shock-value', preocupando-se sempre e unicamente com o realismo. Num plano-sequência quase nunca interrompido (à excepção de alguns cortes no princípio e fim), Oh Dae-su luta contra dezenas de adversários, recorrendo apenas ao martelo que usa como arma e aos próprios punhos. A violência é extrema e, ao mesmo tempo, de uma credibilidade assombrosa. Em qualquer outro filme, não hesitaríamos em descartar isto como algo irrealista em que o protagonista saía miraculosamente ileso, mas não aqui; aqui acreditamos genuinamente no que estamos a ver, sentimos cada murro de Oh Dae-su, que não se limita a desferi-los.
Este plano foi aperfeiçoado ao longo de três dias e dezassete takes, tendo sofrido pouca ou nenhuma alteração em termos de montagem, à excepção da faca que é cravada nas costas de Oh Dae-su, criada digitalmente. Park encena grande parte da acção como um videojogo ao estilo 'side scrolling' (isto apesar de já ter revelado que não era essa a sua intenção), colocando a câmara num carril e acompanhando a luta com travellings subtis, movendo-a ora para a esquerda ora para a direita, consoante o momento da luta. São quase três minutos desta dança de violência, ao som de música antagonicamente bela. Durante estes três minutos, o estreito corredor alarga-se, como os tectos por vezes desaparecem, voltando a estreitar-se quando Park corta novamente para a cara de Oh Dae-su e para a destruição por ele deixada. Quando se apercebe que tem mais oponentes pela frente, sorri perversamente, enfrenta-os e sai, cambaleando, dando seguimento ao seu amor fati vingativo. Até hoje não mais vi algo tão brutal filmado de forma tão magistral." (Pedro Ponte)
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