sábado, 5 de junho de 2010

"Kiss Me, Stupid" - 1964



"Kiss Me, Stupid" é a prova plena que Wilder é tão mais que "Double Indemnity" e "Some Like it Hot" (por muito interessantes que sejam esses filmes, são os mais simples e os que menos segredos resguardam), que a sua obra é tão mais que comédias e dramas e que dividi-la assim é não compreender o cineasta, o artista (ele próprio condenava a catalogação). "Kiss Me, Stupid" é obra de um cínico, é a abolição do cliché e do preconceito (já "Some Like it Hot" o era), é crítica a falsos moralismos e hipocrisias disfarçada de comédia romântica (quão horríveis e maravilhosas são, ao mesmo tempo, aquelas pessoas). Digo, neste momento, que não houve sátiras tão sofisticadas e tão inteligentes (tão ferozes, também) ao "american way of life", diria até ao "worldly way of life", do que as que Wilder produziu nos anos sessenta. "Kiss me, stupid", sim... ele é que a sabia toda...

6 comentários:

João disse...

Vi ontem pela primeira vez, adorei tudo! uma comédia extraordinária que nunca perde aquele leve tom crítico. Tudo muito subtil. Wilder era genial.

João Palhares disse...

É fenomenal, sim. Ok, comédia... mas negríssima. O Wilder era um cínico de primeira e muito do que lá (no filme) está parece-me terrivelmente deprimente...
Era genial, sem dúvida...

João disse...

Muito cínico, sem dúvida João. Não queria catalogá-lo como comédia, claro que é muito mais do que isso. Qualquer filme do Billy Wilder é muito mais do que uma simples comédia.

Li agora o texto que colocaste do João Bénard da Costa, e é um prazer enorme ler o que ele escrevia.

Gosto especialmente destas duas passagens:
"Aqui, nem Felicia Farr (demasiado tonta e demasiado tronco - lá está o molde demasiado explícito e demasiado "sugestivo") nem Kim Novak (coisas de umbigos) salvam as mulheres casadas de se parecer demais com putas e as putas de se parecer demais com mulheres casadas."

"Todos retiraram daquela noite a quatro alguma satisfação. Polly teve a ilusão de ser Mrs. Spooner; Mrs. Spooner teve a sensação de ser Polly; Spooner teve a ilusão de ser Gershwin; Dino teve várias sensações e nenhuma dor de cabeça. Todos tiveram a inteligência da sua estupidez e a estupidez da sua inteligência."

João Palhares disse...

Tenho andado a ler as "Folhas da Cinemateca" dedicadas ao Billy Wilder e vénia ao Bénard, acerta sempre na mouche... :)
O meu Wilder preferido é o "Ace in the Hole", coisa tão desencantada e brutal. Depois o capitalismo / comunismo do "One, Two, Three" e a fábula perversa do "Love in the Afternoon" que, li, é o Wilder preferido de Bénard da Costa...

João disse...

Já agora, onde arranjas essas folhas?

João Palhares disse...

Na 100ª Página em Braga. Tenho lá as do Mizoguchi à minha espera.. :)