sexta-feira, 26 de junho de 2020

CAPTAIN HORATIO HORNBLOWER (1951)


1951 – USA (117') ● Prod. Warner (Gerry Mitchell) ● Real. RAOUL WALSH ● Gui. Ivan Goff, Ben Roberts e Aeneas McKenzie a p. de dois R. de C.S. Forester, «The Happy Return» e «Flying Colours» ● Fot. Guy Freen (Technicolor) ● Mús. Robert Farnon ● Int. Gregory Peck (capitão Horatio Hornblower), Virginia Mayo (Lady Barbara), Robert Beatty (tenente William Bush), Terence Morgan (segundo tenente Gerard), Moultrie Kelsall (tenente Crystal), James Kenney (Sr. Midshipman Longley), James Robertson Justice (Quist), Stanley Baker (Sr. Harrison), Denis O'Dea (almirante Leighton), Alec Mango (El Supremo). 

Em 1807, quando a Inglaterra está em guerra contra Napoleão, uma fragata de trinha e oito canhões, a «Lydia», comandada pelo capitão Horatio Hornblower, homem carrancudo e austero mas de um imenso valor e adorado pelos seus homens, realiza uma missão secreta no Pacífico. Depois de sete meses de viagem, Hornblower entra em contacto com um aliado da Inglaterra, Don Julian Alvarado, dito El Supremo, para lhe entregar um guarnecimento de armas e munições. Ele está em revolta contra os espanhóis e, portanto, enfraquece o poder de um aliado de Napoleão, o que lhe vale a protecção dos ingleses. Megalómano e arrogante, El Supremo ordena que Hornblower lhe dê a «Navidad», navio de guerra espanhol com sessenta canhões, assim que se apodere dele. Hornblower realiza essa façanha, de noite, com alguns homens, esgueirando-se a bordo e apanhando a tripulação de surpresa. Agrilhoa os oficiais na «Lydia» para evitar que eles sejam massacrados por El Supremo, a quem abandona a «Natividad». Alguns dias mais tarde, um pequeno barco espanhol pede para parlamentar com a «Lydia». Hornblower descobre que no seguimento de uma reversão de alianças os ingleses estão agora associados aos espanhóis na luta contra Napoleão. Sobe a bordo uma mulher com os emissários espanhóis, Lady Barbara Wellsley, irmã do duque de Wellington. Fugindo à epidemia de febre amarela que abunda no Panamá, pede para regressar à Inglaterra e Hornblower não pode fazer outra coisa senão aceder ao seu pedido. Ataca a «Natividad» com a sua tripulação e, depois de um combate furioso e de várias manobras audaciosas coroadas de sucesso, consegue destruí-la. Durante a viagem de regresso, Hornblower e Lady Barbara apaixonam-se um pelo outro. Hornblower vela pela sua passageira durante três dias e três noites quando ela é vitimada pela febre depois de ela própria se dedicar a cuidar dos feridos. Mas Hornblower é casado e Lady Barbara, quanto a si, prepara-se para casar com o almirante Leighton. Em Plymouth, Hornblower descobre que a mulher morreu acamada ao dar-lhe um filho. Ele recebe o comando do «Sutherland», um navio com mais de setenta canhões que faz parte do esquadrão de Leighton. Destrói quatro navios franceses ancorados em La Teste, um porto francês no Atlântico. Feito prisioneiro com a sua tripulação, escapa com dois dos seus homens durante a sua transferência para Paris. O trio consegue voltar para Nantes em pequenas etapas. Aí, disfarçados de marinheiros holandeses, os três homens apoderam-se de um barco que transporta prisioneiros ingleses e levam-no para Inglaterra. Hornblower é acolhido como herói em Plymouth, em Londres e um bocado por todo o pais. O rei nomeia-o cavaleiro. Volta a encontrar o seu filho e a sua querida Barbara, agora viúva de Leighton.

► Este divertimento soberbo de Hollywood em que o Technicolor é rei é indubitavelmente o mais sumptuoso filme de aventuras marítimas do pós-guerra. Foi rodado em Inglaterra e na Côte d'Azur (em Nice e em Villefranche). O cenário da «Lydia» foi o maior navio de época já reconstituído em Inglaterra, nos estúdios ultra-modernos de Denham dirigidos por Alexander Korda. Pode-se julgar que em relação aos meios implementados o relevo das personagens deixe a desejar. Mas por outro lado, é a própria finura das personagens, o seu carácter inteira e unicamente heróico que estimulam o devaneio suscitado por esta banda-desenhada de classicismo inventivo e harmonioso. A acção e a aventura contam mais do que aqueles que as vivem. Correndo a toda a velocidade, são como um espelho fascinante virado para a direcção do espectador para que ele mergulhe com a imaginação febril da infância. O filme tem, portanto, um poder onírico muito forte (ligado em parte aos sucessos constantes dos heróis nas suas empreitadas). A partir daí, a improvável localização geográfica de certas sequências (onde Nantes toma a forma de um pequeno porto mediterrânico) já não tem qualquer importância. E este filme sem truculência e sem excessos – os dois registos de predilecção do autor – demonstra mais do que qualquer outro o génio múltiplo de Walsh. Ao construir com Gregory Peck uma caracterização simples, humorística e eficaz para a personagem de Hornblower, ele nem sequer tenta transformar o actor num herói walshiano (o que fará no ano seguinte em O Mundo nos seus Braços). Esculpe entre ele e Virginia Mayo, num registo que não gosta nada mas em que ainda assim é genial, cenas de amor púdicas de uma doçura e de uma elegância incomparáveis. A todo o momento, o filme inventa em modo menor um desenvolvimento novo qualquer, acrescenta ao conjunto uma tonalidade inaudita (um retrato a água-forte de um megalómano grotesco, El Supremo ; uma cena sóbria e discretamente comovente quando Lady Barbara dá um beijo maternal a um jovem marinheiro agonizante). Esta diversidade de tons e de meios também faz parte desse sentido de aventura que o realizador possui ao mais alto grau. Quanto ao resto, ou seja a acção e o combate, Edmond T. Gréville, assistente do filme, descreveu maravilhosamente (in «Présence du Cinéma», nº 13) o método e a vitalidade explosiva do velho mestre. Falando dos actores e dos figurantes, escreve: «Walsh atira-os literalmente para a imagem, numa confusão inaudita, de preferência sem repetições. Conta com o instinto, com a espontaneidade das reacções humanas: “Se dermos em cima deles, vão ser mesmo forçados a defenderem-se” proclamava ele. E, de repente, improvisava um movimento de câmara, uma panorâmica, um enquadramento. Os operadores de câmara e os directores de fotografia caíam como moscas e foi Guy Green quem conseguiu terminar sozinho as filmagens. As cenas rodadas desta maneira terão erros, imperfeições? Walsh não recomeça. Prefere rodar planos de continuidade que permitam eliminar os pedaços duvidosos na montagem, e conservar a frescura inicial da acção. De qualquer forma, ele “via” a maneira como ia montar uma sequência enquanto a filmava. Nunca recomeça mais de duas ou três vezes, achando que para lá disso o actor se torna um mecânico e a sua interpretação estereotipada.»

Jacques Lourcelles, in «Dictionnaire du Cinéma - Les Films», Robert Laffont, Paris, 1992.

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