Não foi por interesse na originalidade que André S. Labarthe, produtor da série "Cinéastes de notre temps", decidiu inicialmente dar como subtítulo ao seu episódio sobre Raoul Walsh «ou le bon vieux temps»[1], e em seguida integrar na montagem do episódio imagens de arquivo dos motins raciais de Los Angeles. Rodado em Agosto de 1965, no dia 19 para ser exacto, este retrato de Walsh foi realizado mesmo no momento em que uma das cidades a priori menos racistas, Los Angeles, era por sua vez vítima dos dramas da segregação. O contraste entre a América de hoje, de Dallas, de Houston e do Vietname, e a de ontem, a de Raoul Walsh ou John Ford, é ainda mais vincado.
Criador essencialmente instintivo, Raoul Walsh fala mal dos seus filmes - as suas muito e demasiado raras entrevistas tinham-nos convencido disso. A Hollywood de ontem permite-o expressar-se: a de hoje redu-lo a um silêncio que ele próprio, de resto, procurou. E apesar do vigor manifesto do homem, que confessa, como antigamente, continuar a fazer longas excursões a cavalo, o cineasta retirou-se de forma mais ou menos definitiva. Rejeita os guiões que lhe são propostos (um western para rodar na Checoslováquia ou na Jugoslávia...) e, no rancho, entre os seus cavalos e a sua esposa loira, evoca com muito mais vontade o passado do que os projectos futuros: o encontro com os irmãos Pathé, com Griffith de quem se tornará assistente e actor, o seu começo na Warner, o trabalho com todos os grandes actores hollywoodianos, Gable, Flynn, Bogart, Cooper.
Citando ele próprio várias vezes a expressão «it was the good old days», é acima de tudo a nostalgia de toda uma época passada que Raoul Walsh evoca, e foi em função dessa reminiscência que André Labarthe montou o seu episódio. Os excertos de filmes que, segundo o próprio princípio da série, servem tanto para ilustrar os temas de um autor como para quebrar a eventual monotonia de uma entrevista, são aqui trazidos a pouco e pouco pela música, primeiro, e depois, finalmente, pela imagem. The King and Four Queens, High Sierra, Colorado Territory, Silver River, White Heat: tantas obras-primas de que Walsh não fala com agrado (ou de todo) mas que a montagem introduz quase de forma imperceptível, como recordações.
Mas o episódio convida a uma verdadeira descoberta de Walsh enquanto homem, muito mais do que um testemunho sobre o artista. O simples facto de poder ver durante perto de cinquenta minutos o realizador de Gentleman Jim, de o ouvir evocar ao sabor de uma frase, e com a voz ligeiramente cansada, a lebre que o privou do olho, a sua forma de enrolar cigarros ou de dirigir McLaglen em Carmen, basta para dar uma visão não apenas nova mas sobretudo fascinante de um dos cineastas americanos mais importantes e nem sempre dos melhores conhecidos. Inseparável da sua obra, Raoul Walsh aparece-nos tão vivo como ela, e poder descobrir durante alguns minutos o homem por trás do cineasta é pelo menos tão exaltante como uma revisão de Battle Cry.
Segundo episódio do «Domínio Americano» de "Cinéastes de notre temps", este retrato um tanto nostálgico de Raoul Walsh faz parte da série que começou com o de John Ford programado em Julho e que deve continuar com uma dezena de retratos entre os quais os de Fuller, Mamoulian, Capra, Cassavetes, Daves, Hitchcock, Hawks, King Vidor. De resto, o problema da escolha dos excertos está longe de estar resolvido no que diz respeito aos cineastas americanos uma vez que, infelizmente, a maior parte das companhias americanas se recusam a conceder o mais pequeno excerto de filme. É assim que, paradoxalmente, Walsh, que foi um dos alicerces da Warner e que além do mais fala com tanta admiração como prazer dos famosos irmãos, não é representado por nenhum dos filmes actualmente distribuídos por essa companhia. Felizmente, alguns destes (Colorado Territory, High Sierra, Gentleman Jim) foram adquiridos, mas temos direito a lamentar que a Warner se tenha oposto à passagem de excertos de Battle Cry e sobretudo Band of Angels.
Apesar de tudo, e se há alguns excertos a faltar à chamada (embora o objectivo de "Cinéastes de notre temps" seja tudo menos a antologia filmada), Walsh a evocar cinquenta anos de cinema americana só pode obrigar o amador a não faltar a este flashback único sobre um dos criadores mais indiscutíveis da tela americana.
[1] «Ou os bons velhos tempos».
in «Cahiers du Cinéma» nº 182, Setembro de 1966.
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