sábado, 30 de julho de 2011
quinta-feira, 28 de julho de 2011
The man who taught his asshole to talk
Bill Lee, em Naked Lunch (1991)
quarta-feira, 20 de julho de 2011
2ª série dos planos (XVII)
"Numa rubrica sobre a importância do plano, acaba por ser tão «desleal» quanto óbvio escolher um filme de Béla Tarr, que, a par de Tarkovsky, tem nessa unidade mínima visível da gramática cinematográfica, a sua imagem de marca. Genericamente, o cinema do cineasta húngaro vê no plano sequência a possibilidade de percorrer lugares que passam a integrar o seu léxico geográfico, mas sobretudo vê neles, ou melhor, busca neles, a capacidade de acompanhar as suas personagens numa continuidade que é tão dramática, quanto da ordem da pura e simples amizade.
A primeira razão pela qual escolho o plano introdutório de Sátátangó, (para quem não sabe, o título significa «o tango de Satã»), é o facto de, na aparente singeleza de uma panorâmica e um travelling sobre uma manada de vacas, se encerrar a responsabilidade de representação do «início de uma dança». Numa obra que vive como poucas da fluência do travelling para explicar os ritmos do dinheiro, das desconfianças e sobretudo da vida muitas vezes incompreensível de uma aldeia comunista dos anos 80 na Húngria, trata-se de um plano com a capacidade de nos introduzir a um espaço e a um universo, de nos fazer sentir à vontade na casa, neste caso, aldeia de um outro.
A segunda razão da minha escolha é bem mais prosaica. O filme de Béla Tarr foi provavelmente o primeiro filme com duração superior a quatro horas que vi. Ora, é inegável a existência de uma barreira psicológica que se prende com o facto do formato das duas / três horas ser algo de forte enraizamento na expectativa de leitura do espectador. Este plano, lembro-me, funcionou há uns anos como uma espécie de introdução à longa duração em que me recordo após o ver de pensar que ainda bem que o filme não ia só ter essas ditas duas/três horas, mas ia afinal durar perto de oito.
No plano, a presença das vacas não possui aqui, como por exemplo na carga dramática de um filme como Au Hasard Balthazar, de Robert Bresson (refiro-me aos planos finais da morte do burro e na sua subida ao «promontório»), um valor sentimental. As vacas, os seus mugidos, as galinhas, o vento, os pássaros, são todos elementos que concorrem em igual medida para colocar o espectador num universo de natureza sem filtro, enquanto desafiam a presença sentida da câmara. Se no início algumas vacas parecem «observar» essa câmara presente, opressiva, esta decide depois deslocar-se pela aldeia, (a fazer lembrar algum cinema de Chantal Akerman, D’est, por exemplo) percorrendo texturas, muros, portões, insígnias nas paredes, oscilando sem pudor entre o animal e o inerte. É um plano de brutalidade, como tudo aquilo que dá que pensar, e que apresenta um espaço. Um plano que «dá as boas vindas» mas oprime, que reúne mas divide.
Um grande plano inexplicável, inexplicado, da História do Cinema, a anteceder uma manhã de Outubro em pleno Outono, a anteceder uma obra fascinante e inesgotável." (Carlos Natálio)
O próximo convidado é o Loot.
terça-feira, 19 de julho de 2011
quinta-feira, 14 de julho de 2011
2ª série dos planos (XVI)
I / II / III / IV / V / VI / VII / VIII / IX / X / XI / XII / XIII / XIV / XV
O próximo convidado é o Carlos Natálio.
quarta-feira, 13 de julho de 2011
Petição (VI)*
Quando são demais
Não fazem por menos
Tornam-se fatais
José Mário Branco
Não é um problema só da RTP, obviamente. É uma mentalidade conjunta, (os tais homem pequenos que se tornam fatais) a nossa, a de que nenhuma acção ou palavra conta, é o deixar correr, que descamba nisto, não se sabe bem como. Porque
"Nenhuma organização, instituição privada ou pública nos ajudou ou quis colaborar de forma expressa e substancial nesta causa"
Vamos ver o Doctor Zhivago e o Ryan's Daughter mil e uma vezes na RTP (penso que entre os vários canais da RTP, passaram perto de dez vezes em 2 anos, cada um) e em 4 por 3, vamos pensar que há uma oferta cultural naquele canal, vamos pensar que este país dá um pentelho pela sua cultura. Pensar que está tudo bem, que tudo se resolve por si, eventualmente. Que o dinheiro vai chegar, que os empregos vão chegar. Como é que fala de classes e de gerações, neste país, se não se tem a mais pequena noção de cidadania e comunidade? Não é possível ter sonhos, ambições, numa sociedade que não os alimente nem os tente incentivar, que nos diz que basta algum conforto e dinheiro para dar sentido à vida. Em tempos de crises várias, de chacota, de desprezo, de desdém, é preciso mais que debates e futebol, é preciso mais que isto. É preciso pensar que com os meios que temos ao nosso dispôr, através dos nossos cargos, "tempo de antena", podemos dar alguma esperança às pessoas, podemos dar-lhes as armas mais poderosas do mundo, a de ver e pensar as coisas de outra maneira, de várias maneiras, a de ser assertivo, compreensivo, em relação ao mundo, a de perceber, precisamente, que há um MUNDO fora deste microíssimo-cosmos de novelas políticas e futebolísticas. É possível ver o caos da vida passar-nos harmoniosamente ordenado à frente dos nossos olhos, a assistir a filmes do Mizoguchi, a ouvir canções dos Beatles, a assistir a interpretações da Nona, dos concertos de Rachmaninoff, e fazer passar algo disso para a forma como vivemos as nossas vidas...
Grande parte dos maiores intérpretes, dos talentos, deste país ou estão nas ruas ou são silenciados, de uma forma ou outra. Criticam e ficam porque amam o testamento cultural lusitano, querem mudar isto. E quem ama o cinema e não tem como o ver como deve ser, está fadado a vê-lo em portáteis, nem sempre nas condições que devia, e a falar sobre ele em blogs, a partilhá-lo assim na esperança de que alguém o veja, nesse processo.
terça-feira, 12 de julho de 2011
Eram mais de cem
"Eram mais de cem, eram mais de mil. Não os contei bem, um milhão de liliputianos, para aí... Os homens pequenos, quando são demais - não fazem por menos - tornam-se fatais. Vão por mim, que eu vivi.. / Como é que um freguês de uma freguesia qualquer, vê o seu destino fazer o pino sem saber ler nem escrever. Homem avisado sempre ouviu alguém dizer que um naufrágio é um presságio do que vai acontecer. / refrão / Vá-se lá saber o que é que esta gente me quer , neste lugar tão singular - ah quem me vá a valer. Há sempre um lugar que falta à gente conhecer. Ah se eu soubera como isto era nunca viera aqui ter / refrão / Preso assim que nem é modo de alguém preso ser. Pequenos filhos, escovadinhos, que assim me estão a prender. Já está tecida uma teia para me tecer, cabeça e pés, os dedos, dez. Já não me posso mexer.. / refrão
... Sem saber ler nem escrever... Que me vai acontecer?... Ah quem me vá a valer?.. Ah se se eu soubera nunca viera... aqui ter... Ahh.. assim me estão a prender.. Já não me posso mexer..."
de alguém que viveu já uma vida inteira..
sábado, 9 de julho de 2011
sexta-feira, 8 de julho de 2011
The Final, Unrealised Projects
by Lotte Eisner (1976)
DEATH OF A CAREER GIRL - In 1964, Lang was president of the Jury at the Cannes Film Festival; Jeanne Moreau was a member of the Jury and suggested that they make a film together. With the actress in mind, Lang wrote a detailed outline of the script. A mature and still beautiful woman, the head of an international economic network contemplates committing suicide because her life and ambitions seem to her to be empty. Her whole life is then seen in flashbacks. Beginning as a young girl working with the French resistance during the Nazi 'occupation', and, like Gina in Cloak and Dagger (Fritz Lang, 1946), by "touching scum becomes scum" in having affairs with Nazi officers. Poor and ambitious she uses men unscrupulously to further her career. As the only man who loves her and treats her with respect sadly explains to her, in the struggle upwards she has lost her soul. At the end of the film, she decides against suicide; as one of the living dead she opens yet another business conference with cold triumph. The agents of Lang and Moreau were unable to settle the conditions of production to their mutual satisfaction and the project was cancelled.
- After this, Lang seriously considered making one last film in spite of his failing eyesight. Claude Chabrol, long an admirer of Lang's work, brought him together in Paris with his own producer, André Génoves, who offered him both complete artistic liberty and an adequate budget. Lang planned a story about contemporary youth, their conflicts and desires, their striving to free themselves from the traditions of the establishment, and their use of drugs. He described to me one beautiful sequence: coloured balls leap from a roof terrace and glide easily down stairs and through the air. A young girl intensely involved in an LSD dream glides down with them. Lang finally decided that his failing sight would not allow him to make the film.
(excertos da última página do livro de Lotte Eisner, dedicado a Fritz Lang)
terça-feira, 5 de julho de 2011
BROKEN BLOSSOMS (1919) – D.W. GRIFFITH
O cinema americano é apreensão do real concreto. Entre o olhar do cineasta e o objecto olhado subsiste, a todos os níveis, uma relação de eficácia. As coisas sendo o que são, adquirem espontaneamente o seu integral peso físico: “a tree is a tree” é o título dado por King Vidor a uma das suas auto-biografias. Nada de olhares turvos, de angustiantes e retóricas “dificuldades de visão” como o que pode considerar-se o exemplo extremo de um cineasta europeu enleado na teia confusa da sua incapacidade criadora: Antonioni.
Se as possibilidades do invento “sans avenir” de Lumière só no States foram globalmente entendidas, foi porque a evolução crescente de uma jovem civilização pragmática, necessitava de uma arte capaz de, por definição, espelhar fielmente a imagem da sua grandeza. O vigor social do cinema americano resulta do empenho dos seus criadores primitivos em prefigurar o curso dessa evolução. Griffith, o seu genial promotor.
Depois da beleza fulgurante de BIRTH OF A NATION, INTOLERANCE ou HEARTS OF THE WORLD, o lirismo velado de BROKEN BLOSSOM, se aparenta negar o estilo das obras precedentes, é para melhor o afirmar, na medida em que o não clarifica o sim e reciprocamente. É a passagem do fresco ao retrato, da sinfonia à sonata. O gesto heróico que acompanhava a majestade de um espaço profundamente aberto, recolhe-se no percurso íntimo de um décor difuso, onde os brilhos esplendorosos da ortocromática de Bitzer não têm cabimento. À importância da montagem que pulsava os ritmos nobres da epopeia, sucede-se a importância do “découpage” baseada nas relações dramáticas das personagens – flores batidas que se curvam ao peso da própria fragilidade, face a um meio demasiado corrupto e violento, e se extinguem suavemente, fechando-se sobre si próprias.
Griffith? Mas é essa suprema sabedoria de, através do actor, enriquecer ao extremo os sentimentos “naïfs”!
Com BROKEN BLOSSOMS, o cinema descobre a sua interioridade."